A melhor chance de erradicar a pólio é agora
“Há algo na ideia de erradicar a pólio que dá asas à imaginação”, afirma Aidan O'Leary. “A maioria das pessoas fala sobre dar passos em direção a conquistas, e raramente há algo de concreto por trás disso. Com a erradicação, não há meio-termo: qualquer coisa acima de zero representa um fracasso. Vamos nos aproximando cada vez mais, mas no final das contas o único número que realmente importa é zero.”
Embora O'Leary, o diretor de erradicação da pólio da Organização Mundial da Saúde, esteja em sua casa, em Galway, diante da paisagem verde do oeste da Irlanda, seu foco está no Afeganistão – um país assolado pela guerra e conhecido por suas planícies áridas, que é um dois últimos lugares do planeta onde o vírus selvagem da pólio ainda circula.
Mesmo durante uma pandemia e mesmo confrontado por realidades sombrias, O'Leary demonstra otimismo sobre a possibilidade de finalmente erradicar a pólio. “Particularmente em tempos de covid-19, há algo de especial na ideia de eliminar uma doença infecciosa altamente transmissível”, afirma ele. “A disseminação da covid também levou muitas pessoas a entender melhor por que este é o momento de terminar esse trabalho e eliminar a poliomielite.”
No entanto, o otimismo de O'Leary é acompanhado por um senso de urgência e pragmatismo. “Não há absolutamente nenhum motivo para nos acomodarmos”, declara. “O mais importante é que redobremos nossos esforços para fazer com que a vacina chegue a crianças que deixam de ser vacinadas de modo persistente, que são uma prioridade do nosso programa.”
O'Leary, que iniciou seu mandato como chefe de erradicação da pólio na OMS em janeiro, assumiu o cargo conhecendo bem o terreno. Anteriormente, ele liderou os esforços de erradicação da pólio do Unicef no Paquistão e foi chefe do Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários no Afeganistão, no Iraque, na Síria e no Iêmen, organizando a resposta de emergência da ONU durante crises.
O'Leary afirma que entende a diferença que o Rotary pode fazer, tanto na comunidade quanto na luta global contra a pólio. Em Galway, uma tradição local envolve chutar o muro de calcário ao final de um passeio de 3 km no Salthill Promenade, à beira da Baía de Galway (o motivo para isso se perdeu na névoa do tempo). Em 2012, explica O'Leary, o Rotary Club de Galway-Salthill instalou naquele muro uma caixa com o slogan “Pequena doação, grande impacto”, incentivando os caminhantes a fazer uma singela contribuição e destinando o dinheiro arrecadado a instituições de caridade locais.
Em julho, semanas antes da reviravolta dramática no Afeganistão, O'Leary participou de uma chamada no Zoom com Diana Schoberg, redatora sênior da revista Rotary, e Dave King, editor da revista Rotary para o Rotary International na Grã-Bretanha e Irlanda, na qual discutiu a nova estratégia da Iniciativa Global de Erradicação da Pólio (GPEI), a nova vacina antipólio e como elas serão usadas para erradicar a pólio de uma vez por todas.
Quais são as últimas informações sobre o vírus selvagem da pólio?
Os números são extremamente encorajadores. Trilhamos uma estrada muito acidentada nos últimos dois anos. Tivemos um aumento de cinco vezes nos casos entre 2018 e 2019, quando foram registrados 176 casos, e, em 2020, o número chegou a 140. Mas registramos apenas dois casos este ano [até 27 de julho]: um no Afeganistão e um no Paquistão [ambos em janeiro].
A parte mais encorajadora neste momento é o fato de que o programa tem uma rede muito elaborada de locais de teste ambiental de esgoto: quase 100 locais no Afeganistão e no Paquistão, que cobrem todos os principais centros populacionais. Em 2020, quase 60% das amostras de teste mensais deram positivo para o vírus da pólio. Neste ano, até o momento, essa porcentagem está provavelmente em torno de 15%. Não detectamos nenhum caso de vírus selvagem da pólio no Afeganistão desde 23 de fevereiro, e foram registrados apenas cinco casos isolados no Paquistão desde 12 de abril.
Na sua opinião, qual é o motivo disso? Considerando que algumas campanhas de imunização contra a poliomielite tiveram de ser suspensas no ano passado, seria natural pensar que os números teriam ido na outra direção. Isso seria em decorrência do fato de que muitos elementos da sociedade foram fechados devido à pandemia?
Embora as condições em 2020 certamente tenham sido adversas, tanto para a vigilância quanto para as operações da campanha, há duas áreas que estão nos ajudando neste ano. Uma delas é a mobilidade reduzida, tanto dentro do Afeganistão e do Paquistão quanto entre as fronteiras. Ao analisarmos especificamente a experiência na Índia, com a explosão de casos de covid no primeiro e segundo trimestres de 2021 (além de algumas imagens muito chocantes de piras funerárias), eu acredito que a redução na mobilidade tenha tido um impacto. Também houve uma mudança nas normas sociais, com medidas muito simples como distanciamento social e lavagem das mãos. Talvez isso também tenha causado algum impacto. Mas essas são mudanças de curto prazo.
Com o conflito no Afeganistão, não acreditamos que os benefícios observados com a mobilidade reduzida vão continuar indefinidamente. Precisamos continuar nos preparando para a possibilidade de deslocamentos entre fronteiras em grande escala. Precisamos aproveitar a oportunidade que temos.
Agora estamos entrando na alta temporada de transmissão da poliomielite, então continuaremos observando atentamente a situação. Certamente, no nosso programa, não estamos nos acomodando.
"A relação mais importante que o programa tem é entre o vacinador da linha de frente e a pessoa que abre a porta da casa.”
As vacinas estão na mente de todos por causa da covid. Isso afetou a aceitação da vacina contra a pólio?
Para mim, as questões mais fundamentais no Afeganistão e no Paquistão giram em torno da confiança das famílias e da comunidade. Se você acertar o básico em relação esse aspecto, já terá percorrido de 80 a 90% do caminho. O desafio sempre está nos outros 10 a 20%.
A questão-chave é mais ampla — a marginalização das comunidades. Isso não é algo que pode ser abordado apenas no nível doméstico e comunitário. Requer um engajamento sistêmico para garantir que entendamos adequadamente as necessidades reais da comunidade e, em seguida, conectemos esses pontos de maneira mais confiável.
A relação mais importante que o programa tem é entre o vacinador da linha de frente e a pessoa que abre a porta da casa. Essa pessoa geralmente é a mãe. E algo muito importante para o nosso sucesso é termos uma mulher local como vacinadora, que seja bem treinada e esteja motivada a fazer o trabalho. Se essa relação de confiança for desenvolvida, você conseguirá vacinar todas as crianças dentro da casa.
Devido à suspensão das campanhas de vacinação de casa em casa em 2018, em áreas do Afeganistão controladas pelo Talibã, mais de 3 milhões de crianças perdem rotineiramente as vacinas. Você acha que a erradicação da pólio é possível enquanto a segurança no Afeganistão continuar tão imprevisível?
Continuamos falando com todas as partes. Nossa prioridade é a proteção das crianças, e isso requer o engajamento de todos. Temos um acordo com o Talibã para conduzir campanhas de mesquita em mesquita, o que esperamos iniciar nos próximos meses. Em alguns casos, vacinaremos crianças pela primeira vez em vários anos. Gostaríamos de aproveitar essas oportunidades para retomar as campanhas de vacinação de casa em casa.
Não temos uma situação de tudo ou nada. Vamos aproveitar a oportunidade para conseguir de 40 a 50% de cobertura antes de começarmos a falar em 100%. As campanhas de julho e agosto serão perfeitas? Não. Elas estão ocorrendo no contexto de um crescente conflito em larga escala. Então, temos que encontrar maneiras apropriadas de fazer as coisas funcionarem.
Haverá riscos. Oito trabalhadores da linha de frente foram mortos no leste do Afeganistão no início deste ano em vários ataques deliberados. Nessas áreas, como as autoridades mudam, precisamos ter a maior sensibilidade possível.
Também estamos trabalhando para financiar a imunização essencial [acesso universal a todas as vacinas relevantes], particularmente nas províncias da região sul do Afeganistão. Reconhecemos que a lacuna não diz respeito apenas à pólio. Ela é muito maior.
Outro ponto que gostaria de salientar é a importância do sistema de vigilância. Embora não tenhamos conseguido vacinar todas as crianças, o sistema de vigilância continua registrando todos os casos de paralisia flácida aguda. Existe um sistema básico que nos permite entender corretamente o que está acontecendo. Queremos progredir de forma incremental e sustentável para que tenhamos acesso a todas essas áreas e possamos alcançar os propósitos dos nossos programas de imunização.
No Paquistão, 81% dos casos estão entre as pessoas que falam pashto, as quais representam 15% da população geral. Por que os casos estão tão concentrados nesse grupo e o que o programa planeja fazer para tratar o problema?
Muitas vezes, o motivo é apresentado como uma questão de aceitação de vacina, mas eu acho que vai além disso. Por causa da migração econômica, entre outras razões, há uma grande concentração de pessoas do Afeganistão e do Paquistão que falam pashto na cidade de Karachi. Vemos uma enorme quantidade de assentamentos, formais e informais, os quais tendem a ser muito mal assistidos. Pode haver problemas entre as administrações estaduais e provinciais e essas comunidades minoritárias. Há uma questão mais ampla em torno da aceitação e confiança da comunidade.
O programa de erradicação da pólio é um dos poucos que atinge essas comunidades, mas suas necessidades vão muito além das vacinas contra a pólio, incluindo água limpa e saneamento, nutrição, serviços básicos de saúde e educação. Então, ao tentar acessar esses assentamentos informais, você tem uma gama de questões a serem resolvidas além da poliomielite.
Essas questões não estão estritamente sob o controle do nosso programa, mas reconhecemos que, para promover a aceitação e a confiança dessas comunidades, teremos que fazer um esforço muito maior do que talvez tenhamos feito no passado. A ideia do nosso lado é passar de iniciativas fragmentadas e isoladas para algo muito mais abrangente e sistêmico.
A nova estratégia fala sobre “crianças com dose zero”. O que significa esse termo?
Crianças com dose zero são aquelas que nunca tomaram uma vacina. Queremos garantir que, além das vacinas orais antipólio, elas também recebam tantas outras imunizações essenciais quanto possível. Não se trata apenas de uma meta fixa e estática de crianças de alto risco em áreas com transmissão persistente do vírus selvagem da poliomielite. Há uma meta móvel à qual devemos estar atentos. Estamos em uma corrida contra o tempo com os recém-nascidos. A cada ano, nascem entre 7 e 8 milhões de bebês no Paquistão. Portanto, precisamos nos certificar de que, nos primeiros meses de vida desses bebês, alcancemos a maior proporção possível deles.
Qual é a melhor estimativa da sua meta?
Sempre que fazemos uma campanha nacional de imunização no Paquistão, que são campanhas de casa em casa, temos como meta mais de 40 milhões de crianças menores de 5 anos. Quando vamos ao Afeganistão, esse número fica entre 9 e 10 milhões. Continua sendo muito gratificante ver o que os trabalhadores da linha de frente estão fazendo durante a pandemia.
Estamos lidando com dois problemas aqui, não é mesmo? O vírus selvagem e o vírus derivado da vacina. Qual é a diferença entre os dois?
O vírus selvagem da poliomielite é basicamente o que o próprio nome descreve. É o original da espécie. Ele evoluiu ao longo dos séculos e milênios e continua evoluindo.
A vacina oral contra a poliomielite contém um vírus vivo, mas enfraquecido, que pode circular entre as populações subimunizadas ou não imunizadas por um longo período, geralmente durante anos. E, em determinado momento, ele pode se transformar novamente em uma forma que causa paralisia. Esse é o vírus da poliomielite derivado da vacina [cVDPV].
Os vírus precisam de uma lacuna de imunidade. Eles precisam de crianças suscetíveis. Onde quer que haja crianças com dose zero, vê-se que essas doenças estão se proliferando. Quando mapeamos a localização dessas crianças, sempre voltamos aos mesmos locais. É por isso que precisamos redobrar os esforços e garantir que a vacinação dessas crianças com dose zero seja nossa maior prioridade.
Globalmente, qual é o nível de disseminação do cVDPV?
Foram registrados 1.800 casos desde 2016. Entre 2018 e 2019, houve uma triplicação de casos e, em seguida, houve uma nova triplicação entre 2019 e 2020. O número total de casos de cVDPV em 2020 foi de 1.103. Até agora, em 2021 [em 27 de julho], foram registrados 179 casos. Vimos um progresso significativo à medida que as campanhas de imunização foram retomadas. O número de países com casos diminuiu de 27 no ano passado para pouco mais de uma dúzia.
Esses casos acontecem quando as crianças deixam de se vacinar. Quando as crianças estão totalmente vacinadas, o cVDPV não é um problema. Esses casos são altamente concentrados, com o Afeganistão e o Paquistão representando 40% deles em 2020. Ao olharmos para a situação no Afeganistão, que foi o país com o maior número de casos de cVDPV no ano passado, mais de 90% deles estavam concentrados em áreas inacessíveis devido à proibição, por parte do Talibã, das campanhas antipólio de casa em casa.
Portanto, novamente, o desafio para nós é proteger por meio da vacinação. Criamos um risco ao não estabelecer níveis de imunidade tão altos quanto poderiam ou deveriam ser. Nosso programa está tentando voltar a um estágio no qual possamos combater a raiz do problema, o que significa vacinar completamente todas essas crianças com dose zero.
Se há dois casos do vírus selvagem da pólio e mais de 100 casos de cVDPV, qual a maior preocupação?
Nós temos duas metas: a primeira é erradicar o vírus selvagem da poliomielite, e a segunda é interromper a transmissão do cVDPV. O vírus selvagem provou ser o mais evasivo. Precisamos eliminá-lo de uma vez por todas. Afeganistão e Paquistão são os países onde os dois tipos circulam simultaneamente. Temos visto muito claramente que, com as campanhas regulares, conseguimos reduzir significativamente os casos de cVDPVs. O vírus selvagem é um desafio muito mais persistente.
Existe uma nova ferramenta para combater os cVDPVs. Como ela foi desenvolvida e o que vocês esperam alcançar?
Em novembro do ano passado, a OMS concedeu sua primeira autorização de uso emergencial para a nova vacina oral contra o tipo 2 [nOPV2]. Essa vacina está em desenvolvimento há quase 10 anos. Ela é tão eficaz quanto as vacinas existentes, mas tem uma estabilidade genética muito maior. Isso diminui a probabilidade de assumir uma forma que possa causar paralisia. O Grupo Consultivo Estratégico de Especialistas em Imunização a descreveu como a vacina recomendada para surtos [de cVDPV] no futuro. Os países que desejam usar a vacina devem atender aos critérios para o uso inicial [no que diz respeito a vigilância e monitoramento de segurança]. Vimos um grande número de campanhas implementadas desde março, com quase 50 milhões de vacinas administradas, e não tivemos nenhum sinal adverso de segurança sério e nenhum sinal adverso de vigilância que pudesse causar preocupação. Estamos trabalhando para ver se conseguimos passar desse uso inicial para uma fase de uso mais amplo, o que reduziria alguns dos requisitos mais onerosos, principalmente no que diz respeito ao sistema de vigilância.
Se você tivesse que apostar, qual seria o seu grau de confiança de que o Afeganistão e o Paquistão ficarão totalmente livres da pólio?
Eu estaria muito confiante.
Nossa nova estratégia tem como metas interromper totalmente a circulação dos vírus selvagem e derivado da vacina até 2023, e obter a certificação do mundo como livre da pólio selvagem até 2026. Um ponto importante é que percebi que essas datas de 2023 e 2026 não significam nada para as pessoas que estão trabalhando diretamente com isso. Passei 20 anos trabalhando com operações. Quando se fala sobre essas estratégias de três e cinco anos, as pessoas perdem o interesse. Precisamos de metas muito mais tangíveis, construídas de trimestre a trimestre.
O que definimos como meta para este trimestre específico [julho a setembro] é abrir a dinâmica de acesso no Afeganistão. Definimos metas, por exemplo, em relação à transição do uso inicial para um uso mais amplo da nOPV2. Estamos observando um progresso muito substancial em relação a isso.
E é por isso que devemos esquecer 2023 e 2026, e nos concentrar no que precisamos fazer neste mês, no próximo mês, no mês seguinte e assim por diante. Devemos manter um ciclo contínuo de melhorias de desempenho, o que é a chave absoluta para atingirmos essa meta.
“Conquistas não são a meta do programa de erradicação. A meta é preencher lacunas: lacunas de acesso, lacunas de vigilância.”
Em junho, a Iniciativa Global de Erradicação da Pólio (GPEI) disponibilizou um documento intitulado “Cumprindo a Promessa Estratégia de Erradicação da Pólio 2022-26”. O que está estabelecido nele acontecerá na prática?
Eu acredito que seja viável cumprir nossos cronogramas e metas e concretizar o que foi estabelecido dentro deles. Mas precisamos ser muito honestos com relação a onde estão as lacunas e o que está sendo feito para preenchê-las. Conquistas não são a meta do programa de erradicação. A meta é preencher lacunas: lacunas de acesso, lacunas de vigilância. Precisamos seguir sempre em frente. Assim, de repente, perceberemos que teremos alcançado nossos objetivos.
Vou destacar duas das situações com as quais lidei ao longo da minha carreira. Comecei a trabalhar na erradicação da pólio em janeiro de 2015 [como chefe de erradicação da pólio no Paquistão para o Unicef] e, naquela época, o programa do Paquistão foi descrito como um desastre pelo Conselho Independente de Monitoramento. Em 2014, houve 359 casos globais de vírus selvagem da poliomielite, dos quais 306 foram no Paquistão. Dois anos e meio depois, reduzimos esse número para cerca de três. Acho que tivemos um total de oito no ano. Trabalhamos para superar os desafios. É importante ter um foco inabalável e encontrar o caminho crítico para a erradicação. Essa foi a lição nº 1.
Quando assumi essa função, em janeiro, me perguntaram por que eu estava tomando a frente do programa naquele momento. Para mim, nada é assustador e nada é impossível. O desafio é entender onde você está e, então, concretamente, quais são as medidas práticas que você precisa tomar. Para mim, a grande conquista do ano passado foi continuar na luta. Às vezes, as pessoas subestimam como foi significativo colocar o programa de volta em funcionamento no meio da pandemia. Houve decisões muito corajosas por parte dos governos e dos trabalhadores da linha de frente, bem como de muitas outras pessoas.
Uma estratégia anterior foi publicada em 2019. O que não estava funcionando e como a nova estratégia está trazendo novas ideias?
A epidemiologia estava se distanciando cada vez mais do zero, e então veio a pandemia de covid, que foi uma virada de jogo fundamental. Havia uma preocupação real de que o programa tivesse perdido sua orientação de emergência. Houve também um reconhecimento da necessidade de se rever seriamente as demandas mais amplas da comunidade.
Outra parte está relacionada à responsabilidade do governo. Uma coisa é a GPEI ter sua orientação de emergência. Mas também precisamos que essa orientação de emergência seja identificada pelos governos. Uma das coisas que mais me impressionaram no Paquistão foi ver como a infraestrutura do Centro Nacional de Operações de Emergência passou a ser usada para apoiar a resposta à pandemia. Havia uma reunião diária sobre a covid com os principais líderes provinciais, os militares e o Ministério da Saúde. Todos os grupos analisavam dados em tempo real, tomavam decisões e, em seguida, assumiam a responsabilidade de realizar ações de acompanhamento. Queremos transmitir a mensagem de que, embora a magnitude da emergência da pólio não tenha a mesma escala da pandemia de covid, incentivamos a aplicação desse mesmo modus operandi.
A outra parte que deve ser reforçada é a gestão de desempenho e risco. Já conversamos sobre 2023 e 2026. Mas quais são todos os marcos? Ao analisarmos nosso desempenho, as correções de rumo são fundamentalmente melhores quando são feitas no momento. Precisamos fazer isso de uma forma muito mais estruturada, com métricas-chave.
Qual aspecto é o seu principal foco? O que tira o seu sono à noite?
Aproveitar as oportunidades que estão à nossa frente. Manter o foco inabalável nas crianças que, de modo persistente, deixam de ser vacinadas. Temos muitas iniciativas, mas elas não são igualmente eficazes. O que realmente importa é saber se o que estamos fazendo (campanhas, postos de saúde móveis ou imunizações de rotina) está nos ajudando a vacinar mais uma criança em uma área com transmissão persistente do vírus. Estamos progredindo a cada campanha, a cada atividade que fazemos, e nos aproximando cada vez mais da nossa meta?
O que me tira o sono à noite é o risco que correremos se não tivermos um foco inabalável nisso. Podemos gerar grandes números, mas estamos realmente vacinando as crianças certas com todos os nossos esforços?
Qual é a sua mensagem para os rotarianos?
Estou nesta função há seis meses. Já me reuni com rotarianos virtual e presencialmente na Índia, na África, no Paquistão e no Afeganistão. Não detectei nenhum tipo de diminuição no comprometimento. Há um foco muito claro. A mensagem é simples: um mundo sem pólio está ao nosso alcance. Existe uma oportunidade, e precisamos aproveitá-la.
Destaques do plano estratégico
Em junho de 2021, a Iniciativa Global de Erradicação da Pólio (GPEI) lançou um novo plano estratégico chamado "Cumprindo a Promessa": Estratégia de Erradicação da Pólio 2022-26”, com duas metas: interromper a transmissão do vírus selvagem da poliomielite nos dois países endêmicos restantes (Afeganistão e Paquistão) e impedir surtos do vírus derivado da vacina (cVDPV), que ocorrem quando o vírus vivo usado na vacina oral antipólio sofre mutações e volta a assumir uma forma virulenta à medida que circula entre populações não imunizadas e subimunizadas. Veja como faremos isso.
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Defesa da causa junto a políticos: Trabalhar com governos para gerar maior urgência e responsabilização por respostas rápidas e eficazes a surtos. Criar relacionamentos pessoais e aumentar o nível de confiança com representantes nacionais, provinciais e locais para desenvolver uma melhor compreensão dos benefícios do programa de combate à pólio. Explorar opções para contornar a proibição da vacinação de casa em casa em partes do Afeganistão.
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Engajamento da comunidade: Criar parcerias significativas com comunidades de alto risco afetadas desproporcionalmente pela pólio, como as de língua pashto no Afeganistão e no Paquistão. Criar comissões nas quais membros da comunidade possam contribuir para o planejamento de campanhas de combate à pólio e comunicar outras necessidades de saúde. Trabalhar com influenciadores que falam pashto, como parteiras e associações de mulheres, para desenvolver uma melhor compreensão de como a vacinação contra a poliomielite pode apoiar suas práticas mais amplas de cuidados infantis.
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Melhoria das operações: Fortalecer as campanhas recrutando e treinando trabalhadores de linha de frente que sejam da comunidade, falem a língua local e sejam mulheres. Garantir que os trabalhadores da linha de frente tenham suprimentos e segurança para fazer bem seu trabalho e recebam oportunidades de desenvolvimento profissional. Adotar inovações técnicas, como mapeamento digital e pagamentos móveis aos trabalhadores. Implantar a nova vacina oral contra o tipo 2 (nOPV2), aprovada recentemente, para combater surtos.
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Integração da poliomielite aos programas de saúde: Fazer com que todas as vacinas cheguem a crianças com dose zero no Afeganistão e no Paquistão. Apoiar a implementação da vacina contra a covid-19. Fazer com que as vacinas antipólio sejam parte de um conjunto mais amplo de serviços básicos e de saúde, desenvolvido em parceria com as comunidades. Apoiar as unidades de saúde no fornecimento de uma dose da vacina oral antipólio aos recém-nascidos.
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Aprimoramento da vigilância: Para acelerar as respostas a surtos, usar inovações técnicas para obter resultados mais rápidos ao fazer testes do vírus da pólio em crianças com paralisia. Integrar a vigilância da poliomielite aos sistemas de vigilância de outras doenças que podem ser evitadas com vacinas, como sarampo e covid-19.
Artigo extraído da edição de outubro de 2021 da revista Rotary.